12 de julho de 2006

Teoria e prática: uma inepta dicotomia

Teoria e prática: uma inepta dicotomia

Por Bruno Guilherme Cassimiro

A dicotomia ou antagonismo entre teoria e prática não passa de mera falácia. Não há separação ou abismo entre teoria e prática, ambas possuem uma relação inclusiva e vinculada. A práxis não se encontra em um fosso que a separa da teoria, como queria Aristóteles, com a radical oposição entre atividade concreta (prática) e reflexão teórica (teoria), nem tampouco é uma mera ação objetiva que modifica o mundo, aplicando, superando ou concretizando uma “crítica social teórica”, como queria Marx. E a teoria não é um conhecimento de caráter estritamente especulativo, desinteressado, abstrato, em oposição à prática e a qualquer saber técnico ou aplicado.

O filósofo e professor Gilles Deleuze, assim como Michel Foucault, não concebia a prática como aplicação ou oposição da teoria, nem concebia a teoria como pensamento meramente inspirado pela prática. Para Deleuze, “a prática é um conjunto de revezamentos de uma teoria a outra e a teoria é um revezamento de uma prática a outra”, desse modo, não há que se falar em prática ou teoria auto-suficiente, ambas estão sempre relacionadas, vinculadas e entrelaçadas.

Fora da prática social, a teoria não faz nenhuma diferença no mundo do ser, a “desvinculação da teoria com a prática a transforma em mero palavreado” [1]. As leis são conjuntos de abstrações, generalidades, conjuntos de fenômenos fixados em conceitos e categorias gerais, ordenados e classificados, formulados teoricamente. Poder-se-ia dizer, conforme o pensamento marxista ou aristotélico, que as leis, enquanto abstrações teóricas (da teoria do direito ou da teoria política), encontram-se divorciadas da realidade, dos costumes, da prática jurídica, jurisdicional, processual etc.

Talvez o Direito construa sua própria realidade que não se confunde com o mundo real, mas bastante acertado parece o entendimento do emérito Arnoldo Wald, em entrevista concedida à Revista Consultor Jurídico de 9 de Julho de 2006, que diz: “as normas jurídicas devem ter algo a ver com a realidade brasileira. As leis têm de ser criadas considerando a prática” [2].

Do mesmo modo, a prática, tomada como auto-suficiente, é mera técnica, mero know-how. É impossível se conhecer todas as “possíveis técnicas” de todos os “possíveis contextos”, de modo que um operador do direito, por ex., necessita de “condições mínimas e necessárias para que possa desenvolver a habilidade para quando se deparar com o novo, saber avaliá-lo, julgá-lo, apreendê-lo e modificá-lo de acordo com a realidade na qual está inserido” [3]. A habilidade só poderá ser desenvolvida se houver um bom arcabouço teórico, pois, nem sempre a mera técnica será suficiente.

Portanto, torna-se indispensável e fundamental o papel das “teorias” (do Direito, da sociologia, da política etc.) na solução (e desenvolvimento) de situações práticas, bem como o papel da prática para o adequado desenvolvimento da teoria. A teoria e a prática estão de tal forma entrelaçadas, interligadas, que se nos detivermos à prática (conhecimento técnico) sem a teoria (reflexão crítica), não teremos condições de solucionar um caso novo, diferente dos anteriores, não teremos condições de avaliá-lo, julgá-lo, apreendê-lo, e/ou modificá-lo de forma adequada. Assim também, se nos detivermos à teoria fora do contexto prático em que está inserida, qualquer conceituação, criação ou abstração não passará de mero psitacismo, mero palavreado vazio. Ainda segundo o pensamento do ilustre Deleuze, “nenhuma teoria pode se desenvolver sem encontrar uma espécie de muro e é preciso a prática para atravessar o muro”.

Em consonância com o pensamento de Deleuze e Foucault (com certa influência de Nietzsche) e conforme certa inspiração em Bobbio (ilustre “teórico” e “prático”), destaco a importância da utilização de teorias-modelo (teoria do direito, teoria política, sociológica, psicológica, lingüística etc), precisamos nos servir dessas teorias-modelo, precisamos reler os clássicos, reinterpretar os teóricos. Precisamos das “muitas teorias” para construir um embasamento crítico, precisamos construir “conceitos” gerais e abstratos e, através desse embasamento e dessa conceituação, tentar “compreender” a realidade (compreensão limitada pelo nosso aparato cognoscitivo, que é uma das fronteiras entre o real e o imaginário), pois “quanto maior for o grau de concretude do pensamento, menor será a compreensão da realidade” [4].

A partir do momento em que conseguimos “compreender” a realidade (ainda que parcialmente), após o revezamento entre as muitas teorias, após a criação ou formulação de “conceitos”, após o exercício da “arte do pensar”, seremos capazes de solucionar situações práticas. Deve haver, portanto, criação de conceitos (ideais) e "produção de acontecimentos" (no mundo real), em um perpétuo jogo entre o abstrato (teórico) e o concreto (prático).

Por fim, é indispensável destacar o “ensinamento” de Nietzsche, segundo o qual “É preciso aprender a pensar. (...) A arte de pensar deve ser aprendida como uma dança. É preciso saber dançar com os pés, com as idéias (conceitos), com as palavras, com a pena (caneta)”[5].

[1] SERAFIM, Maurício C. A Falácia da dicotomia teoria-prática. In: Revista Espaço Acadêmico, Ano I, n. 7, Dezembro de 2001.
http://www.espacoacademico.com.br/007/07mauricio.htm .

[2] Revista Consultor Jurídico. Entrevista: Arnoldo Wald.
http://conjur.estadao.com.br/static/text/46158,1 .

[3] SERAFIM, Maurício C. A Falácia da dicotomia teoria-prática. In: Revista Espaço Acadêmico, Ano I, n. 7, Dezembro de 2001.
http://www.espacoacademico.com.br/007/07mauricio.htm .

[4] Idem.

[5] NIETZSCHE, Friedrich. Crepúsculo dos Ídolos: ou como filosofar a marteladas. Trad. Carlos Antônio Braga. São Paulo: Escala, pp. 62-63.

20 de junho de 2006

Fé, Ciência e o Judiciário: psicografia como prova judicial

Em um Estado laico, aceitar a psicografia como prova judicial implica em uma contradição dentro do próprio sistema jurídico. Se aceitarmos a psicografia como prova no processo judicial, em breve também teremos que aceitar o exorcismo ou possessão demoníaca como procedimentos ou fatos legítimos e aceitáveis em um processo judicial, por exemplo.

Observando a questão da aceitação da psicografia como prova no Tribunal de Júri, recordo do filme "O exorcismo de Emily Rose" . O filme é de terror ou suspense, mas o caso de exorcismo e o julgamento descritos no filme são verossímeis, inspirados em fatos reais, considero-o um filme de Tribunal, apesar de toda a alegoria que fazem. O filme conta a história de um padre acusado de homicídio culposo que, por acreditar que uma garota estava possuída pelo demônio, recomenda a rejeição de auxílio médico e passa a praticar uma série de rituais de exorcismo, que culminam com a morte da garota. De fato, muitos acreditavam que a garota estava possuída, inclusive a Igreja católica reconheceu a possessão demoníaca da garota. Entretanto, a promotoria alegava que o padre havia sido negligente, que a menina não havia sido possuída pelo demônio e que ela sofria de epilepsia, alucinações, esquizofrenia, psicose etc.

Ambos os casos suscitam a contraposição entre Fé e Ciência, mais precisamente o espiritismo versus as leis da física, e de outro lado o catolicismo versus a medicina. E no meio dos litígios encontra-se o Judiciário, o tribunal de júri. E no tribunal do júri encontramos cidadãos de notória idoneidade, representantes da sociedade, não são necessariamente médicos, ou espíritas, católicos ou operadores do direito. Mas quando o cidadão comum participa do tribunal do júri, ele passa a agir como um auxiliar da justiça, exercendo um papel de "operador do direito", ele julga, decide. No entanto, para o Tribunal do Júri não importa se a verdade está na fé ou na ciência, importa a inclinação do júri (cidadão comum, representante da sociedade) para um lado, ou para o outro.

Particularmente, como cidadão comum acho muito difícil decidir entre fé e ciência, mas, como operador do direito, concebo como inaceitável a legitimação de psicografias, exorcismos ou possessões demoníacas no processo judicial. Não apenas pelo simples fato da gritante contradição e inconstitucionalidade perante o Estado laico, mas pelo simples fato de haver valoração moral ou religiosa, valoração de fé. Como poderemos aceitar algo que se coloca como fé, algo que não podemos dizer se é verdadeiro ou falso? Deveremos aceitar a prova através do princípio do in dubio pro reo? Por exemplo: não sabemos se a carta psicografada é autêntica ou não, ela é permitida no Brasil porque é uma liberdade de crença constitucional, a psicografia é baseada na fé, mas o Estado não pode garantir a autenticidade, então, in dubio reus est absolvendus, na dúvida, inocentamos o réu. Outro exemplo: no caso do exorcismo, não sabemos se houve ou não possessão demoníaca, já que a possessão é baseada na fé, então, o padre não pode ser condenado por homicídio devido ao in dubio reus est absolvendus.

A fé está atrelada a juízos de bem e de mal, juízos morais, juízos religiosos. Considero inaceitável e inconstitucional a utilização de princípios religiosos e demais valorações de fé no processo judicial, salvo quando a própria constituição determinar a aceitação. Portanto, como operadores do direito, filósofos ou cientistas, devemos nos colocar muito além do bem e do mal, muito acima de juízos morais ou religiosos. A aceitação jurídica de preceitos de determinada doutrina religiosa pode implicar na negação de preceitos de uma outra doutrina religiosa, o que é incoerente com o Estado Laico.

Psicografias ou possessões demoníacas são fatos morais, religiosos, são fatos de fé. E, além da inconstitucionalidade, o juízo religioso deve ser excluído do processo judicial por acreditar em realidades que não existem. Acertado parece o entendimento do filósofo Friedrich Nietzsche, em seu Crepúsculo dos Ídolos, que diz: "o juízo religioso pertence a um grau de ignorância em que a 'noção da realidade', a distinção entre o 'real' e o 'imaginário' não existem ainda, de modo que em semelhante grau a palavra 'verdade' só serve para designar coisas que hoje chamamos 'imaginação'".

Mas não questiono a liberdade de crença religiosa, a qual respeito demasiadamente*.

6 de junho de 2006

Dancem, Macacos, Dancem!

*Vídeo extraído do site YouTube

*Segue abaixo a transcrição da narração:

Sobre Quem Somos Nós: Dancem, Macacos, Dancem!

Há bilhões de galáxias no universo observável e cada uma delas contém centenas de bilhões de estrelas, em uma dessas galáxias orbitando uma dessas estrelas há um pequeno planeta azul e este planeta é governado por um bando de macacos. Mas esses macacos não pensam em si mesmos como macacos. Eles nem sequer pensam em si mesmos como animais, de fato, eles adoram listar todas as coisas que eles pensam separá-los dos animais: polegares opositores, autoconsciência, eles usam palavras como Homo Erectus e Australopithecus. Você diz to-ma-te, eu digo to-ma-ti. Eles são animais, certo?

Eles são macacos. Macacos com tecnologia de fibra ótica digital de alta velocidade mas ainda assim macacos. Quero dizer, eles são espertos, você tem que conceder isso. As pirâmides, os arranha-céus, os jatos, a Grande Muralha da China, isso tudo é muito impressionante, para um bando de macacos.

Macacos cujos cérebros evoluíram para um tamanho tão ingovernável que agora é bastante impossível para eles ficarem felizes por muito tempo, na verdade, eles são os únicos animais que pensam que deveriam ser felizes, todos os outros animais podem simplesmente ser.

Mas não é tão simples para os macacos, pois os macacos são amaldiçoados com a consciência e assim os macacos têm medo, os macacos se preocupam, os macacos se preocupam com tudo, mas acima de tudo com o que todos os outros macacos pensam. Porque os macacos querem desesperadamente se encaixar com os outros macacos. O que é bem difícil, porque a maior parte dos macacos se odeia.

Isto é o que realmente os separa dos outros animais. Estes macacos odeiam. Eles odeiam macacos que são diferentes, macacos de lugares diferentes, macacos de cores diferentes.

Sabe, os macacos se sentem sozinhos, todos os 6 bilhões deles.

Alguns dos macacos pagam outros macacos para ouvir seus problemas. Os macacos querem respostas, os macacos sabem que vão morrer, então os macacos fazem deuses e os adoram. Então os macacos começam a discutir quem fez o deus melhor, e os macacos ficam irritados e é quando geralmente os macacos decidem que é uma boa hora de começar a matar uns aos outros.

Então os macacos fazem guerra. Os macacos fazem bombas de hidrogênio, os macacos têm o planeta inteiro preparado para explodir, os macacos não sabem o que fazer.

Alguns dos macacos tocam para uma multidão vendida de outros macacos. Os macacos fazem troféus e então eles os dão para si mesmos como se isto significasse algo.

Alguns dos macacos acham que sabem de tudo, alguns dos macacos lêem Nietzsche, os macacos discutem Nietzsche sem dar qualquer consideração ao fato de que Nietzsche era só outro macaco.

Os macacos fazem planos, os macacos se apaixonam, os macacos fazem sexo e então fazem mais macacos. Os macacos fazem música, e então os macacos dançam. Dancem, macacos, dancem! Os macacos fazem muito barulho, os macacos têm tanto potencial. Se eles pelo menos se dedicassem...

Os macacos raspam o pêlo de seus corpos numa ostensiva negação de sua verdadeira natureza de macaco. Os macacos constroem gigantes colméias de macacos que eles chamam de "cidades". Os macacos desenham um monte de linhas imaginárias na terra. Os macacos estão ficando sem petróleo, que alimenta sua precária civilização. Os macacos estão poluindo e saqueando seu planeta como se não houvesse amanhã. Os macacos gostam de fingir que está tudo bem.

Alguns dos macacos realmente acreditam que o universo inteiro foi feito para seu benefício, como você pode ver, esses são uns macacos atrapalhados.

Estes macacos são ao mesmo tempo as mais feias e mais belas criaturas do planeta, e os macacos não querem ser macacos, eles querem ser outra coisa, mas não são.

Veja o Vídeo no Site do YouTube

1 de junho de 2006

"Habeas carrum": animus jocandi ou ignorantia juris?

IustitiaParece mentira (e vale ressaltar que ainda tenho minhas dúvidas quanto à veracidade dessa aberração jurídica), mas um estudante de Direito resolveu "peticionar" um "habeas carrum" lá em Florianópolis. Aproveitando a nova onda de HC para lá, HC para cá, um tal de Rodrigo Cunha resolveu "requerer respeitosamente" um "habeas carrum". Chega a ser hilário. "Venho humildemente requerer a liberação do veículo". (...) "Estando o paciente [veículo] sofrendo coação ilegal em sua liberdade de ir e vir, requer o impetrante a V. Exa. se digne de mandar que o mesmo lhe seja imediatamente apresentado, e de conceder a ordem de HABEAS CARRUM, ou qualquer outro que possibilite a liberação do veículo".

Apesar de hilária, a petição foi bem redigida, e até chega a ser bem fundamentada, mas a tentativa de requerer um "habeas carrum" suscita duas possibilidades: animus jocandi ou ignorantia juris.

Como já era de se esperar, o Juiz Newton Varella Júnior indeferiu o pedido. O juiz demonstrou-se incomodado com a situação, alegou que prefere acreditar que houve falta de conhecimento jurídico do requerente, e não deboche. Além disso, o magistrado ainda fez questão de ressaltar o excesso de trabalho na seção judiciária, in verbis: "quero crer que pelo relato feito na presente e pela falta de conhecimento jurídico demonstrado, que tal situação não se trata de deboche, já que num primeiro olhar soa como gozação e menosprezo ao trabalho do Poder Judiciário, que só nesta seção possui cerca de cinco mil processos para serem tutelados."

A notícia foi publicada pelo portal jurídico Espaço Vital, onde encontramos também a "petição inicial do habeas carrum" e a "decisão do juiz Newton Varella Júnior". O conteúdo é duvidoso, mas não deixa de ser hilário. Pois é, fica a dúvida no ar: a) seria a notícia inverídica?; b) seria o habeas carrum apenas um gracejo do estudante?; c) Ou seria o habeas carrum fruto de um desconhecimento jurídico?.

17 de maio de 2006

Brasil: talvez ainda haja esperança

por Beth Bayma

A população brasileira está nas mãos de homens egocêntricos e desinteressados. Homens cujo padrão de vida e popularidade são colocados em primeiro plano. "Nossos representantes" são nada mais nada menos que administradores de caixa. E o que somos nesta história? Nada, ou melhor, tudo: nós os mantemos.

A verdade é que o homem não é perfeito. É até admissível que haja erros e problemas em qualquer organização, seja ela nossa família, seja um partido político, seja um poder do Estado. O que é inadimissível é o descaso, desinteresse, a roubalheira. Talvez seja utópico e até clichê dizer isso, mas falta humildade. Humildade de reconhecer que somos todos iguais, não importa em que status nos encontremos.

Não existe praga pior do que o orgulho e a vaidade exarcebada. Ambas corrompem o homem e fazem dele um simples cérebro sem coração. Como está explícito na própria Bíblia, "é tudo vaidade e correr atrás do vento". Engraçado é como existem pessoas que criticam, que vêem os erros, que ficam indignadas com a situação, mas se mantêm inertes. De que adianta sermos meros espectadores?

Honestamente, não sei se há saída. As coisas podem até melhorar, mas muito difícil chegarmos a uma situação de tranquilidade plena. A corrupção já está impregnada. A praga já se espalhou. Mas... talvez ainda haja esperança.

16 de maio de 2006

Facções criminosas e falência prisional

Facções criminosas como o Comando Vermelho (CV) e o Primeiro Comando da Capital (PCC) têm, em geral, suas origens vinculadas a presídios e penitenciárias. O CV originou-se no presídio da Ilha Grande, enquanto o PCC surgiu, provavelmente, no Centro de Reabilitação Penitenciária de Taubaté.

A formação dessas organizações criminosas está ligada à degradante condição do sistema prisional brasileiro. Claro, a formação do crime organizado remete não apenas ao sistema físico, carcerário, mas também, a nossas abstratas e gerais leis penais e processuais. As condições do sistema prisional influenciam também na própria manutenção e operacionalidade dessas organizações criminosas. Organizações que se encontram muito bem articuladas e desenvolvidas, controlando e liderando mega-operações criminosas, narcotráfico e mega-rebeliões simultâneas.

Não é à toa que o sistema prisional brasileiro merece os apelidos pelos quais a população o identifica, tais como: cemitério dos vivos e universidade do crime. Fruto de descaso e omissões do poder público, o sistema prisional brasileiro proporciona condições cruéis e desumanas aos detentos. No entanto, estes sofrimentos físicos e psicológicos pelos quais os detentos passam a conviver no cárcere não os ressocializam, nem previnem o surgimento de novos crimes, pelo contrário, fomentam ainda mais a criminalidade. O criminoso(ou inocente) pé-de-chinelo tem, no cárcere, o tempo necessário e bons professores para sair graduado no crime organizado ao longo do cumprimento de uma pena que não o ressocializa.

O cárcere não é o único problema. Nossas leis também necessitam de reformas urgentes, e, em parte, já há um encaminhamento e um direcionamento do poder público neste sentido. Entretanto, reformas legislativas dependem do Congresso Nacional, o qual “não anda muito bem das pernas”.

O ilustre criminalista Eugênio Zaffaroni diz que "o sistema penal é uma epidemia que afeta a quem tem defesas baixas". Uma grande verdade. Qual é a categoria dos detentos no Brasil? São os 3 P´s - puta, preto e pobre -, ou seja, aqueles que têm as defesas mais baixas na sociedade brasileira.

Obviamente que essas defesas baixas decorrem da enorme desigualdade social e econômica em nosso país, do descaso do governo, dos escassos investimentos em educação e das péssimas condições de vida dessas camadas desfavorecidas, de maneira geral, econômica, jurídica, educacional, política e socialmente.

O poder público, hoje, precisa enfrentar o poder paralelo dessas facções criminosas, tem que combater o narcotráfico, a corrupção policial, entre outras mazelas. Mas esse combate se torna enormemente difícil, já que a delinqüência, a corrupção, a preguiça e a fraude estão enraizadas no próprio poder público, do Executivo ao Judiciário, do menor ao maior. Quem sabe o PCC não se torna um partido político e acaba tomando o poder? Talvez não seja uma realidade muito distante.

15 de maio de 2006

Ataques do PCC: organização criminosa x desorganização do poder público

As retaliações do Primeiro Comando da Capital (PCC) à tentativa das autoridades de isolar os líderes da facção criminosa já causaram, até o momento, mais de 70 mortes. Informações extra-oficiais apontam para mais de 90 mortes, e os números tendem a aumentar. Segundo informações das agências de notícias, as ações criminosas, iniciadas na última sexta-feira (12/05), já contabilizam 150 ataques no estado de São Paulo. Os principais alvos dos ataques foram delegacias, postos, veículos militares e policiais em trabalho ou de folga, no entanto, mais de 10 agências bancárias já foram atingidas e mais de 70 ônibus foram incendiados, números que também tendem a aumentar. Além dos ataques, 45 penitenciárias ainda mantêm rebeliões simultâneas de presos e o número de reféns em poder dos presos é de cerca de 196 pessoas, segundo balanço divulgado pela assessoria de imprensa da Secretaria de Administração Penitenciária do Estado de São Paulo às 11h desta segunda-feira.

A situação é mais do que alarmante, o número de mortos e o número de ataques deste final de semana colocam São Paulo no mesmo patamar do Iraque, onde o número de mortos (extra-oficial) em ataques não foi superior a 50, isto porque foi um dos finais de semana mais violentos das últimas semanas no Iraque. A situação é alarmante, assusta e causa pânico na sociedade. A população teme ser atingida, teme pelo poder público não poder conter a força das ações criminosas. Pelo menos seis das empresas de ônibus de São Paulo mantiveram seus veículos nos pátios para evitar depredações, é apenas uma pequena amostra dos efeitos do terror e do medo que as facções criminosas podem provocar na sociedade.

Terror, tensão, incerteza e insegurança. O crime organizado está mostrando sua força, está mostrando sua articulação. Narcotráfico, tráfico de armas, corrupção policial e ausência de efetivas políticas públicas de segurança colaboram para a proliferação do crime e a articulação organizada dos criminosos. Como exemplo do descaso do poder público é possível citar a redução de 28% nos gastos do governo com o Fundo Nacional de Segurança Pública. Segundo o Blog do jornalista Fernando Rodrigues, em 2004, o governo federal desembolsou R$ 380,8 milhões para o Fundo Nacional de Segurança Pública. Em 2005, a cifra caiu para R$ 275,8 milhões. Em 2002, último ano do governo FHC, o governo desembolsou R$ 396 milhões para o fundo, em valores atualizados em março deste ano pela ONG Contas Abertas.

Em relação aos ataques do PCC e às mortes de policiais, o governador do estado de São Paulo, Cláudio Lembo (PFL), declarou, de maneira desagradável, que as retaliações do PCC eram previsíveis e que os efeitos são ínfimos. O governador declarou também que a situação está sob controle e rejeitou intervenção da polícia federal. Em outras desagradáveis declarações do governador, divulgadas pelo site da Veja On-Line, Lembo disse que os advogados dos presos têm grande parcela de responsabilidade na comunicação entre criminosos e anunciou que pretende acabar com o sigilo entre advogados e prisioneiros em suas conversas dentro dos presídios. Além disso, chegou a acusar os advogados de serem responsáveis pela entrada ilegal de telefones celulares nos presídios. O governador ainda atacou a legislação, os advogados e os parentes dos presos dizendo: "é um grande erro, uma lenda, mantida até por parte das autoridades, achar que o celular é o grande problema. Não é o celular coisa nenhuma. São determinados elementos que entram nos nossos presídios, baseados na legislação, e coletam informações, inclusive do mundo exterior".

Lembo parece querer atirar a culpa em outros para livrar a "culpa" do poder público, que é o principal responsável pela desordem da segurança pública. É possível concordar com a possibilidade de encontrarmos "criminosos" que se "disfarçam" de advogados e contribuem para a "empresa" do crime organizado, mas não podemos descartar também a atuação de "criminosos" que se "disfarçam" de policiais, agentes penitenciários, políticos, entre outros corruptos que fazem parte de quadrilhas e colaboram com facções como o PCC. Além do mais, é inadmissível a gravação das conversas entre presos e advogados, conforme salienta o presidente da OAB de São Paulo, Luiz Flávio D’Urso. O presidente da OAB-SP revida as declarações de Lembo dizendo que "o estado tem de assumir seu papel e sua responsabilidade. E o estado não está à altura desse combate. Falhou com o celular, com o bloqueio de sinal do celular nos presídios e falhou na desarticulação da facção criminosa".

As autoridades sabiam das ameaças de ataques do PCC, mas a "desorganização" do Poder Público não foi suficiente para conter a organização da facção criminosa.

A desorganização do Poder Público brasileiro decorre de inúmeras "palhaçadas". O país parece um verdadeiro "picadeiro", um circo, dos mais cômicos e irônicos possíveis de se imaginar. Em termos energéticos, o país atingiu "autosuficiência" em petróleo, mas um louco populista desenfreado latino-americano que ocupa o cargo de presidente da Bolívia deflagrou a recente e famosa "crise do gás" estabanando as glórias da conquista energética. Em brasília, a crise política parece estar sendo superada, embora sempre apareça uma "picuinha" aqui ou ali. Mas o país está diante do "maior escândalo" de corrupção dos últimos tempos, tem dança da pizza ou dança da impunidade para quem achar melhor, tem o Congresso Nacional mais "nojento", "asqueroso", corrupto, fraudulento, farsante, podre e impune que se possa imaginar, tem o "Garotinho fazendo coisa de gente Gandhi", entre outras ironias do cenário político nacional. Por outro lado, tem coletiva de imprensa de técnico da seleção brasileira, tem clima de Copa do Mundo, tem expectativa de hexacampeonato, fazendo com que a população brasileira esqueça as "crises" que tanto atormentam nossas mentes.

Diante de todas as irônias e "palhaçadas" do cenário brasileiro, percebe-se que o "circo" está "pegando fogo". Os ataques do PCC, aliados a outros indicadores (como os ataques e ameaças de Evo Morales), fazem com que se perceba a inépcia e a desarticulação dos políticos, dos governistas, do poder público. O Brasil possui organizações criminosas que governam e comandam muito melhor articuladas do que nossos governistas. As organizações criminosas possuem muito mais harmonia do que os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, por exemplo.

Para combater essas crises políticas, energéticas, de segurança, ou seja lá qual for a crise é preciso que haja harmonia entre os políticos e os poderes do Estado. É preciso acabar com essa angústia de oposição criticar governo e de governo criticar oposição e político se vender como prostituta para outro partido e um partido político comprar um outro partido como aliado. O poder público está se desintegrando, os ataques do PCC demonstram isso. Falta planejamento, organização, direção, controle, investimentos, além disso, a legislação brasileira é inadequada e as decisões jurídicas são ineficientes e muitas vezes ineficazes. Tudo isso é fruto de descaso do poder público, descaso dos nossos políticos e governantes e até mesmo descaso da própria população.

O Brasil precisa mudar, o brasileiro precisa mudar. O país está em ano de eleições, o Congresso Nacional está podre e os partidos políticos estão apodrecendo. Enquanto o país passa por inúmeras crises, os políticos enxergam apenas os seus próprios "umbigos", preocupados com seus bolsos, com a imagem de seus partidos políticos, com a imagem de suas candidaturas. Criam uma série de políticas públicas eleitoreiras, mas políticas públicas eficazes e harmônicas não existem. O que se percebe no cenário político brasileiro é um político querendo mais espaço do que o outro, um político atacando o outro, um partido brigando com o outro, uma disputa inesgotável por poder político. Mas não são vistas no cenário político discussões acerca das políticas de segurança, educação, saúde, saneamento, nada, apenas guerras de vaidades e poder. Desse modo, nós, brasileiros, somos largados e entregues aos sopros do acaso, a favor de nossa própria sorte, aos mandos e desmandos de alguns nojentos e corruptos representantes do povo e ainda precisamos conviver com o terror e a ameaça de facções como o PCC.

13 de maio de 2006

A condição de existência humana – uma perspectiva nietzscheana

Inspirado em digressões filosóficas de meus caros professores da Faculdade de Direito do Recife (Torquato Castro Jr. e Alexandre da Maia), resolvi escrever algo sobre a condição humana e a razão da existência.

Sempre fui bastante cético e pessimista com relação à condição humana. Talvez inspirado em Machado de Assis e a sua visão negativista do mundo, da sociedade e do homem em si. Mesmo o ser humano mais inofensivo e pacífico em sua aparência pode ocultar uma personalidade contraditória e até mesmo ameaçadora.

A sociedade humana é uma tentativa e não um contrato, como muitos queriam. É uma tentativa de existência, sobrevivência, inclusão, reconhecimento e aceitação. Uma tentativa pesada até para o mais forte, indecifrável até para o melhor intérprete. As relações humanas são complexas demais, são incertas demais e o mundo nos é apresentado em múltiplas versões das quais ninguém pode se gabar de possuir uma compreensão melhor do que os outros.

Entretanto, é simples exemplificar a fraqueza de nossa sociedade. A mentira e a farsa do ideal foram até agora a blasfêmia contra a realidade, as pessoas fantasiam o mundo, um mundo imaginário, um mundo possível, e dizem: “esse é o meu mundo, ele deve ser assim”, mas esquecem da realidade ao redor do seu mundo; muitos encontram-se jogados à própria sorte, não são vistos ou ouvidos e o homem se encarrega de fazer do lobo um cão e do próprio homem o melhor animal domesticado pelo homem.

As pessoas não ouvem umas às outras; possuem um “segundo” rosto, e até um “terceiro” rosto, usam máscaras, escondem-se; por suposta superioridade, assumem atitudes prepotentes ou de desprezo com os outros; não sentem constrangimento por seus atos censuráveis; costumam tomar a si mesmas como referência para tudo; fingem, dissimulam os verdadeiros sentimentos, intenções; desejam sempre gozar ou possuir o que é gozado ou possuído por outrem; indignam-se, encolerizam-se, vingam-se e punem em razão de alguma ofensa; são movidos pela concupiscência, cobiçam bens materiais e desejam intensamente os prazeres sensuais; admiram o próprio mérito, e possuem excesso de amor-próprio; avaliam a si mesmos enaltecendo com exagero.

Senhoras e senhores, “Eis o homem”: Arrogância, Cinismo, Egoísmo, Hipocrisia, Inveja, Ira, Luxúria, Orgulho e Vaidade. É o retrato de nós mesmos, retrato de nossa realidade. Fugir dessa realidade é covardia, é fraqueza, não devemos jamais poupar a nós mesmos. Devemos ter a dureza e a frieza em nossos hábitos para que possamos permanecer contentes frente às duras verdades da nossa realidade.

Eis a verdadeira condição humana, “aquele que não quiser morrer de sede entre os homens deve aprender a beber em todos os vasos, e o que quiser permanecer puro entre os homens deve aprender a lavar-se em água suja”(Nietzsche). Somos todos animais, unidos pela sobrevivência. A “pureza” da Moral - limpa e cristalina - aprisiona alguns e transforma outros em porcos.

Diante da realidade de nossa condição humana, questionamo-nos: Qual a razão de nossa existência? Seria o homem apenas um equívoco de Deus? Ou seria então Deus apenas um equívoco da fraqueza, do cansaço e do sofrimento do homem diante de um mundo antagônico? Será que simplesmente devemos abandonar tudo, não aceitar absolutamente mais nada, não tomar mais nada, não ingerir nada, não levar mais nada para dentro de si – não reagir?

O homem, em sua existência, está condenado à liberdade, não escolhemos nem optamos por nascer, mas somos livres em nossas decisões por toda a vida. E a vida “é um grande palco, onde somos meros atores, atirados à vida sem nenhum roteiro para seguir, apenas usamos máscaras e representamos papéis”(Jostein Gaarden).

Contudo, a dúvida permanece: Qual a razão da existência humana? Pouco importa. Não é a dúvida, é a certeza que nos enlouquece. “Nós engordamos todos os outros seres para que nos engordem; e engordamos para engordar os vermes.”(Shakespeare) “Para quê queres tu mais alguns instantes de vida? Para devorar e seres devorado depois?”(Machado de Assis)
10.03.2006

19 de abril de 2006

George Bush e a Ordem Jurídica Internacional Pós-Moderna

Considerações Acerca da Interdependência e da Interferência dos Estados numa Conjuntura de Insegurança e Incerteza
Por Bruno Guilherme Cassimiro

George Bush e Interferência Interestatal

O jornal The New York Times publicou nesta quarta-feira, 19 de Abril, uma declaração do presidente Bush defendendo o Secretário de Defesa Donald Rumsfeld, que se propôs a demitir-se duas vezes após os escândalos de Abu Graib, prisão iraquiana. Segundo o Times, o presidente Bush declarou: "I'm the decider, and I decide what's best. And what's best is for Don Rumsfeld to remain as the secretary of defense." Algo que pode ser traduzido como: "eu sou o decididor, e eu decido o que é melhor, e o melhor para Donald Rumsfeld é permanecer como secretário de defesa."

As declarações de Bush soam, para alguns, como discursos prepotentes, arrogantes, ditatoriais, fascistas. Aparentemente o presidente norte-americano gostaria que todos gritassem para ele "Heil, Bush", o que o aproximaria bastante de Hitler. E o que Bush fez? Matou soldados americanos e inocentes no Oriente; dirigiu mal a política econômica de seu país; tomou atitudes visando a interesses particulares. São incansáveis as críticas ao governo do presidente Bush e à sua política externa intervencionista.

Outros diriam que Bush intenta ser como Jesus Cristo, um messias, “enviado” para salvar o mundo. Entretanto, intentando “evangelizar os outros Estados”, Bush utiliza belos discursos políticos, discursos religiosos, éticos, democráticos, e falseia a realidade de forma arrogante e prepotente. O presidente parece crer que "ele é a verdade", aparenta crer no dogma de "sua única verdade" e sua forma correta de enxergar o mundo.

Mas, ao contrário de Jesus, que utilizava o “amor”, a “justiça”, a “paz”, a “esperança”, a “fraternidade”, etc, Bush utiliza a força e o poder da hegemonia econômica, militar e política dos Estados Unidos para impor suas ideologias e intervir nos outros Estados, atentando contra a soberania, a independência e a liberdade civil, militar, econômica e política dos Estados. As atitudes do presidente não coadunam com seu discurso, e seu discurso não passa de mera estratégia argumentativa de convencimento e de falsa explicação da realidade.

O presidente dos Estados Unidos possui uma ratio, uma razão comunicativa. A ratio de Bush não é baseada no rigorismo metódico e científico da Idade Moderna, mas se fundamenta na linguagem e na comunicação. A razão de Bush é composta pelo “Discurso”, uma ação comunicativa, destinada a fundamentar as pretensões de validade das afirmações e das normas nas quais se baseia implicitamente, Discurso vazio que não se identifica com suas atitudes, mas dota de racionalidade suas atitudes intervencionistas.

Desse modo, a justiça, a democracia, a liberdade e a igualdade “evangelizadas” pelo presidente Bush ferem os ideais de outros Estados, ferem culturas de nações. As interferências interestatais atentam contra a “soberania” dos Estados. Será que intervenções interestatais, como as do presidente Bush, baseadas em ideais de Justiça, podem ser consideradas “justas” diante de um mundo “multicultural”? A resposta quase unânime poderá ser um “Não”.

Globalização e Interdependência dos Estados

Devido à escassez dos recursos tanto naturais, quanto científicos, intelectuais, tecnológicos, humanos, etc, existe uma forte interdependência dos Estados, onde um necessita do outro, um busca no outro caminhos para manter sua existência, manter a existência de sua Soberania, seu Território, seu Governo, seu Povo. A partir daí, surge uma discussão em torno de uma determinada Globalização, estaríamos diante de um “mundo globalizado”, dizem alguns. Mas de que Globalização tratam aqueles que se referem a um “mundo globalizado”? Globalização jurídica, ética, moral, religiosa ou cultural? Talvez se trate de uma Globalização Econômica, esta é, possivelmente, a Globalização a que se referem.

E com a Globalização Econômica surgem os interesses econômicos e “particulares”, particulares que se utilizam da força e do poder dos Estados. O que se observa é uma quase completa ausência de alteridade, assistencialismo e cooperação entre os Estados. Assistimos a uma busca individualista pela satisfação do “eu”, satisfação do “ego do Estado”, ou do “ego econômico”, que muitas vezes não reflete os anseios dos povos, ou nações, mas atende meramente aos interesses particulares das elites governantes. Em elites governantes refiro-me a ideologias políticas, religiosas, econômicas, ou qualquer outra forma de poder ou dominação que possa influenciar no Governo de um Estado.

Crise Mundial, Insegurança e Incerteza

Presenciamos, atualmente, uma crise mundial, um contexto de insegurança e incerteza. Não estamos mais diante de um clima de tensão da Guerra fria, mas, sim, diante de incertezas e inseguranças políticas, jurídicas, econômicas e sociais tanto no âmbito intraestatal quanto interestatal ao redor do mundo. Ameaças terroristas, ascensão de preço do petróleo, tensão Estados Unidos-Oriente, medo, terror e conflitos sociais na Europa, entre outras tensões.

Surgem, então, descrenças nas instituições ditas democráticas, surge uma perda de legitimidade nas instituições e questionamentos, tais como: a) qual o verdadeiro papel de Organismos Internacionais como a ONU (Organização das Nações Unidas) ou a OMC (Organização Mundial do Comércio)? b) Seriam institutos jurídicos ou meramente políticos? c) Seriam organismos meramente consultivos sem força impositiva, não dotados de coercitividade? d) A ONU é capaz de manter a Ordem Internacional, “promover a cooperação internacional e conseguir a paz e a segurança”, conforme preceitua o artigo 1 da Carta da ONU? e) Qual o papel do Direito diante da conjuntura mundial pós-moderna? f) Podemos tratar da existência efetiva de um Direito Internacional? g) É possível fixar conteúdos ético-jurídicos universalmente válidos?

Papel dos Organismos Internacionais

Os organismos Internacionais atuam, aparentemente, como meros instrumentos políticos, de caráter “simbólico”, virtualmente cogentes e sugestivamente sancionais sem serem impositivos, tais Organismos não conseguem cumprir seus preceitos, que se tornam meros discursos argumentativos sem força, encontramos “conceito” acima de conteúdo e “forma” acima de princípio. “Cooperação internacional, paz e segurança”? Apenas discurso vazio. Quem tem mais “poder”, a ONU ou o presidente dos Estados Unidos? Mas, talvez ainda existam determinados esforços efetivos no âmbito das atividades dos Organismos Internacionais, sob o prisma “humanitário”, entre outros efeitos.

Ordem Jurídica Internacional

Cada vez mais, encontramos um distanciamento entre um “suposto” dever ser (sollen) e a condição de ser (sein) dos Estados. É preciso repensar o papel do Direito como um compromisso humanístico e efetivo.

Diante da conjuntura mundial pós-moderna de interferência interestatal questionamo-nos acerca do papel do Direito e da existência de um Direito Internacional. Poderíamos afirmar a inexistência efetiva de um Direito Internacional, bem como a necessidade do surgimento de um Direito autônomo, independente, cogente e universal. A partir daí, chegaríamos a dois pressupostos teóricos interessantes sob o ponto de vista jurídico-político Internacional: o Estado de Natureza Hobbesiano e a Ordem Jurídica Cosmopolita de Kant.

Poderíamos traçar um paralelo entre a conjuntura atual dos Estados e a teoria de Hobbes, assim teríamos que: os Estados se encontram em um contexto onde impera insegurança e instabilidade. Nesse contexto, anárquico, cada Estado têm direito a todas as coisas, cada qual pode utilizar de todos os meios para se satisfazer, levando os Estados igualmente ao “medo”, medo de perder sua soberania, seu território, medo de “afetação” do seu governo, do seu povo. A partir daí, o Estado passa a adotar uma postura mais agressiva de atacar antes de ser atacado. Estariam assim, os Estados, diante de um estado de natureza, onde “hobbesianamente” haveria um direito natural, isto é, a liberdade que cada Estado possui de usar seu próprio “poder” e “força”, da maneira que quiser, para preservação de seus “interesses” e a integridade de sua soberania, seu território, seu povo, e seu governo. Portanto, na concepção hobbesiana os Estados podem utilizar todos os meios que puderem para defenderem a si mesmos.

Em Kant, poderemos extrair a Ordem Jurídica Cosmopolita, que, a priori, coadunaria com o “ideal” de Direito Internacional. A Ordem Jurídica Cosmopolita seria um tratado de paz global visando a assegurar uma ordem pacífica entre os Estado fundamentado em uma liga de Estados para evitar guerras. Kant considerava que o estado de guerra estava mais próximo da natureza humana que o estado de paz, como Hobbes, e defendia a introdução de regras globais públicas obrigatórias.

Considerações Finais

Entretanto, prevalece ainda hoje a visão de Hobbes. A Ordem Internacional encontra-se diante de um estado de natureza, onde os Estados estão, simbolicamente, protegidos por uma ordem ético-jurídica provisória firmada pela ONU, ordem que se encontra orientada politicamente para as estratégias de poder, força e interesse das Potências Mundiais.

Apesar dos esforços de muitos em ratificar a exigência de estruturas legislativas, executivas e judiciárias de política internacional, em oposição à pífia atuação da ONU, é mister salientar que nos encontramos diante de uma impossibilidade teórica de firmar conteúdos ético-jurídicos universalmente válidos.

No Preâmbulo da
Carta da ONU, encontramos propósitos e tentativas de fixar conteúdos éticos universais, tais como: reafirmar a fé nos direitos fundamentais do homem, na dignidade e no valor do ser humano, na igualdade de direitos entre homens e mulheres; estabelecer condições para manter a justiça; praticar tolerância e viver em paz. No entanto, tais preceitos não são necessariamente válidos para todos, possuem conotação extremamente subjetiva, por exemplo, “dignidade e valor do ser humano” possuem sentido extremamente variável de cultura para cultura, assim como a “igualdade entre homens e mulheres”, como trataremos essa igualdade em tais e tais culturas? Outra questão é o preceito de “manter a justiça”, o senso de justiça do Ocidente e Oriente são de tal forma divergentes que é difícil agradar um sem ofender ao outro. Além disso, há também o preceito da “prática da tolerância”, como tolerar o intolerante? É possível incutir essa mentalidade no âmbito mundial?

Diante da complexidade mundial, da multiplicidade de valores e dos aspectos multiculturais, torna-se praticamente impossível fixar e reconhecer princípios éticos mínimos que valham universalmente. Uma tentativa qualquer pode soar como arbitrária ou de cunho puramente subjetivo.

Enquanto não se firmar uma ordem ético-jurídica que dê conta de todas as divergências sob um mesmo senso de justiça continuaremos a observar “belas” estratégias argumentativas como o discurso de Bush ou o Preâmbulo da Carta da ONU. Discursos repletos de Direitos, mas vazios de Justiça.

13 de abril de 2006

Esculhambador Geral da República: José Simão

"Sabe como se chama o advogado que o PT quer empurrar para o Palófi? João PIZA! O quê? Mais pizza?"

"Três coisas que ninguém quer ser: ministro do Lula, vice do Alckmin e técnico do Corinthians."

"Ser ministro do Lula é como motel: alta rotatividade. Profissão de alta rotatividade."

"Sabe por que o Márcio Thomaz Bastos não vê escândalo nenhum? Porque a Justiça é cega!"

"Suzane von Richthofen matou os pais e foi solta. E aí enganou o "Fantástico" e foi presa! Ou seja, nunca engane o "Fantástico"!"

"Suzane von Richthofen consultando o advogado: "Eu tenho alguma chance de ser absolvida?". "Só se for julgada pelo Congresso Nacional.""

"Mais uma piada pronta: o Ministério Público indiciou 40 mensaleiros. Quarenta? Agora só falta o Ali Babá! Ali Babá e os 40 mensaleiros."


da Folha de S. Paulo, 13 de abril de 2006
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Visite o Site de José Simão

2 de abril de 2006

HACKERS, SPAMMERS, SPAMS, FRAUDES

Hacker usa Nestlé para conseguir e-mails

É falso o e-mail que está circulando pela internet afirmando que a Nestlé distribuirá um kit com seus "novos produtos" caso a pessoa repasse a mensagem para outros 15 endereços. A empresa chegou a colocar uma advertência na principal página de seu portal eletrônico na tentativa de impedir que o tal e-mail continue a ser repassado pelos desavisados.

O e-mail falso diz que o departamento de marketing sugeriu à empresa que divulgasse por endereço eletrônico os novos lançamentos da linha Nestlé. Para tentar dar maior credibilidade ao e-mail, o hacker pede para que a mensagem seja enviada para 15 pessoas com cópia para um determinado endereço eletrônico (ca.veklischer@nestle.com.br).

Cristina Veiga
Especial para o site Gilberto Dimenstein
30/11/2004
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A Notícia é antiga, mas o falso e-mail continua circulando pela internet, enganando e ludibriando pessoas. Além disso, a falsa mensagem da Nestlé não é a única mensagem fraudulenta a circular pela internet, inúmeros desses e-mails indesejados são disseminados diariamente em correios eletrônicos pelo mundo inteiro. Esses e-mails fraudulentos são chamados de Spam, e-mails não solicitados que geralmente são enviados a um grande número de pessoas.

Apesar da enorme quantidade de filtros de Spam existentes atualmente, os Spammers(autores de Spam) conseguem mascarar e disfarçar suas mensagens como e-mails autênticos, escrevendo palavras de forma errada, escrevendo espécies de conto de fadas, textos de caridade, promoções, entre outras formas.

Antes de encaminhar e-mails do tipo “corrente”, com promoções encantadoras, ou qualquer outro tipo de e-mail que no final solicite a divulgação para tantas e tantas pessoas, procure verificar a autenticidade e a veracidade do conteúdo do e-mail. Geralmente esses e-mails são falsos. Essas listinhas de ajuda, caridade, criança sofrendo, etc etc etc, regra geral, são e-mails enganosos, falsos, fraudulentos.

Os hackers utilizam-se de Spam para adquirir uma vasta quantidade de endereços eletrônicos e, dessa forma, poderem disseminar vírus e spywares. Ao encaminharmos uma mensagem via e-mail, é anexada ao corpo de texto a lista de destinatários do remetente anterior. Assim, quando continuamos a encaminhar indiscriminadamente, fornecemos a hackers uma preciosa lista de e-mails.

Portanto, quatro dicas:

1. Verifique a autenticidade dos e-mails. Em uma rápida pesquisa no
Google você descobre se o e-mail é fraudulento ou não;

2. Apague o e-mail do remetente e a lista de destinatários ao encaminhar um e-mail;

3. Ao enviar e-mails, escreva os nomes dos destinatários no espaço reservado para cópia oculta (“CO:” ou “CCO:”);

4. Utilize filtros de Spam.

Visite o Site Gilberto Dimenstein

31 de março de 2006

Emir Sader e FHC

Achei interessante a Coluna(Nem Veja. Nem Leia.) do professor Emir Sader no site da agência Carta Maior, publicada em 30 de Março de 2006, e decidi compartilhar com outras pessoas. Acho importante para a formação de todos, enfim.

A Coluna contém uma crítica à reportagem de Capa da revista Veja sobre o livro do ex-presidente FHC. Sinceramente, não li toda a reportagem da Veja, nem li o livrinho "A arte da Política" de FHC. Mas devo admitir que o título do livro soa como "A arte da guerra" de Maquiavel, "A Arte da Guerra" de Sun Tzu ou "A arte da prudência" de Baltasar Gracián, eu diria até que soa como "O Príncipe"(livrinho de cabeceira do ex-presidente) de Maquiavel.

Um trecho da reportagem de FHC à Veja diz o seguinte: “de certa maneira, é possível estabelecer um paralelo estrutural com O Príncipe, realização máxima do pensador italiano Nicolau Maquiavel, de quem Fernando Henrique é grande conhecedor.” Espero profundamente que nosso querido sociólogo e ex-presidente não tenha a pretensão de querer ser enquadrado no mesmo patamar dos autores supracitados.

O professor Emir Sader lista peremptoriamente diversos motivos para não lermos o livro de FHC, e ainda assevera que o livro contém “autobajulações e autojustificativas, perfeitamente adequadas a que se esqueça antes mesmo de ler”, o professor completa dizendo “não veja, nem leia”.

Além de críticas pesadas à reportagem da Veja, Emir Sader chama o ex-presidente de decadente e marginalizado. Vocês concordam com a opinião de Sader em relação à decadência e marginalização do ex-presidente? Eu diria que, em sua atividade política, sim. Mas não me arriscaria a dizer que enquanto sociólogo e intelectual ele seja decadente e marginalizado, pelo contrário, acredito que o ex-presidente possui uma formação intelectual bastante invejável, e é um dos maiores intelectuais do Brasil ainda vivo.

O professor da UERJ não pára por aí, critica o governo do ex-presidente, não poupa esforços para citar diversos escândalos e irregularidades no governo FHC e diz que FHC é o mais rejeitado de todos os nomes aventados como candidatos à presidência da República. De fato o governo FHC possuía irregularidades demais, falcatruas demais, era fraco demais. Entretanto, Sader diz que FHC se tornou “tão rancoroso diante do sucesso de Lula e de sua política externa”. Sucesso de Lula? Bem, não gosto de discutir política, não sou petista, nem sou de direita, nem de esquerda, mas de que sucesso ele está falando? Acho que esse sucesso é um tanto quanto relativo.

É interessante salientar a referência do professor Sader ao sonho frustrado de FHC em conseguir um cargo internacional, o professor ironiza dizendo que o ex-presidente tem que se contentar com o luxuoso escritório no Vale do Anhangabaú, montado por grandes empresários paulistas.

Por um lado o ex-presidente traz no currículo um governo fraco, repleto de irregularidades e escândalos; encontra-se, hoje, politicamente decadente e marginalizado; tornou-se rancoroso diante do governo de um adversário político; e é frustrado por não alcançar um sonho. No entanto, por outro lado, FHC possui um enorme reconhecimento entre os intelectuais do mundo inteiro; seu nome figura na lista dos 100 intelectuais mais notórios do mundo elaborada pelos leitores da Prospect e do portal Foreign Policy; o ex-presidente é o único brasileiro da lista, ocupa a 43ª posição e tem o privilégio de figurar na mesma lista que intelectuais como Paul Krugman(economista norte-americano, e colunista político do The New York Times), Jürgen Habermas(filósofo e sociólogo alemão, notável pelas suas reflexões acerca da razão comunicativa), Umberto Eco(historiador e filósofo, autor da famosa ficção “O nome da Rosa”), Eric Hobsbawn(historiador, com publicações renomadas no mundo inteiro, autor de “A era dos extremos”), entre outros.

Enfim, recomendo a leitura de Maquiavel, Sun Tzu e Emir Sader. Mas talvez seja interessante dar uma olhada no trabalho de Fernando Henrique Cardoso.